O meu ofício de “perito externo” consiste em ler (documentos internos, planos de melhoria, relatórios trimestrais e anuais do TEIP, contratos de autonomia, planos de acompanhamento da IGEC, etc.); em ver (aulas de apoio, ninhos; alunos na biblioteca/nos pátios; interações entre professores/direção, entre professores/alunos); em ouvir (relatos de dificuldades/êxitos de professoras(es); relatos de vitórias do pessoal dos gabinetes de apoio psicossocial; desabafos de responsáveis do pessoal auxiliar); em falar (em reuniões com a direção do agrupamento/a equipa de coordenação dos TEIP; ou em jornadas de reflexão sobre resultados, em ações de formação, em reuniões gerais sobre a assinatura de contratos de autonomia da escola,). Também escrever (emails, itens de questionários, textos de reflexão)
2. Que dificuldades principais enfrento?
A complexidade dos problemas das escolas.
A diversidade de áreas em que as escolas precisam de apoio.
As lógicas de ação de resistência ativa e passiva face a tentativas de mudar de paradigma, isto é, de mudar as rotinas “ancestrais”, ineficazes e, nalguns casos, mesmo absurdas. Ou seja, a dificuldade em passar da preocupação com o cumprimento formal de normas (“dar o programa todo”, inventariar as dificuldades de todos e cada um dos alunos e registá-las na atas do conselho de turma) para a focagem nas aprendizagens (curriculares, claro) dos alunos.
3. Como as procuro superar?
Procuro superar as dificuldades fazendo formação sobre os temas que (às direções das escolas e a mim) nos parecem mais urgentes. Mas, para isso, tenho eu próprio de pesquisar, de (re)ler, antes de preparar materiais de formação específicos. E preciso de sentir que há professores disponíveis para aprender.
Noutros casos, elaboro, apresento e discuto propostas de ação, pequenos projetos de investigação-ação (mais ou menos formal).
4. Como poderá ser mais eficaz a minha ação de fazer os professores e a organização trabalhar melhor ao serviço das aprendizagens dos alunos?
No que não depende de mim:
Com mais estabilidade organizacional, professores colocados a tempo e horas e não tardiamente.
Com diretores menos bloqueados pelas “plataformas” do ME e outras exigências regulamentares do sistema educativo. Ou seja, com mais autonomia responsável das escolas.
Não ficar restrito a um pequeno grupo de professores.
Poder integrar, na instituição de ensino superior, uma equipa pluridisciplinar de apoio ao “perito” para responder com formações curtas, no local de trabalho, muito dirigidas a necessidades específicas dos professores.
No que depende de mim:
Dada a precariedade do contrato escola/universidade/perito, faz pouco sentido pensar em termos de futuro. Mas, façamos de conta que ...
No domínio do apoio à melhoria das aprendizagens:
- criar, entre os professores, comunidades de prática focadas em pequenos projetos ligados à prática pedagógica quotidiana; assim:
- eleger, em diálogo com professores, um ou dois temas considerados centrais (a avaliação de diagnóstico, as formas de feedback ao aluno, ...) e desenhar projetos de investigação-ação logo no início do ano letivo, conduzindo-os ao longo do ano e avaliando processos e resultados no final desse ano.
- estabelecer com pequenos grupos de professores contratos de produção/ recolha/ utilização de materiais pedagógicos que facilitem o estudo autónomo do aluno.
- desenhar com pequenos grupos de professores um projeto de levantamento de exemplos de concretização do princípio pedagógico da continuidade da experiência (isto é, de integração das vivências dos alunos na prática pedagógica quotidiana).
No domínio da monitorização e avaliação:
- conseguir sensibilizar as direções das escolas para a necessidade de colocar o uso da autoavaliação no topo da agenda da liderança da escola;
- procurar que, com uma adequada governação da comunicação interna (que tem de passar pela simplificação documental), se consiga uma maior participação responsável da comunidade educativa, a começar nos professores.
- insistir em que há vida para além das metas e dos indicadores. Ou seja, que é necessário narrar histórias de mudanças positivas significativas, que evidenciem melhorias nas aprendizagens dos alunos.
Nestes e em todos os outros domínios: precisamos de encontrar mais tempo para escrever e tornar público o que fomos vendo, ouvindo e lendo e não devemos deixar cair no esquecimento.
5. Que balanço breve faço?
Na comparação do deve e do haver, parece-me que o saldo é positivo porque ideias que defendi ou que surgiram de diálogos em que tive participação ativa, se tornaram práticas organizacionais ou educativas. E algumas destas são hoje rotinas eficazes, aceites sem grandes reservas.
Nada do que foi conseguido teria acontecido sem a confiança, a escuta ativa, a aceitação e o dinamismo de algumas pessoas, seja professoras(es) em lugares de liderança de topo ou intermédia, ou que simplesmente gerem diariamente situações de ensino-aprendizagem, seja técnicas(os) que encontram formas de não deixar cair alunas(os) ou de levar a escola ao bairro.
Alguns alunos terão aprendido mais devido a tudo isto? Talvez. Mas ainda falta dar sustentabilidade a muito do que foi feito.
Víctor Alaiz