“Ensinar não é uma actividade como as outras. Poucas profissões serão causa de riscos tão graves como os que os maus professores fazem correr aos alunos que lhes são confiados. Poucas profissões supõem tantas virtudes, generosidade, dedicação e, acima de tudo, talvez entusiasmo e desinteresse.
Só uma política inspirada pela preocupação de atrair e de promover os melhores, esses homens e mulheres de qualidade que todos os sistemas de educação sempre celebraram, poderá fazer do ofício de educar a juventude o que ele deveria ser: o primeiro de todos os ofícios.” (Pierre Bourdieu, 1986)
Escrita em 1989, esta passagem de um relatório – Proposições para o ensino do futuro – que mantém plena actualidade serve para constantemente nos lembrar que o “ofício de educar a juventude deveria ser o primeiro de todos os ofícios”: o primeiro no reconhecimento político e institucional; o primeiro na valorização social; o primeiro na prática da autonomia e da responsabilidade; o primeiro na reivindicação de melhores condições para ensinar e para aprender.
E serve ainda para lembrar que “só uma política inspirada pela preocupação de atrair e promover os melhores” é que poderá fazer da profissão docente a primeira (isto é, a mais nobre e fundamental e decisiva) das profissões.
Num tempo em que todas as promessas se repetem, é a hora de lembrar (uma vez mais) a urgência da reforma dos modos de acesso à formação inicial dos professores; a urgência da reforma dos currículos da formação inicial; a urgência da regulamentação do acesso à profissão docente; a urgência de uma formação contínua que esteja, de facto, ao serviço de melhores práticas de ensino; a urgência da criação de melhores condições de trabalho (em termos de espaços, equipamentos…); a urgência de uma avaliação que reconheça e promova o mérito profissional; a urgência de incentivos simbólicos e materiais para quem trabalha em condições adversas; a urgência…
Este é, em termos meramente exemplificativos, o quadro de uma política que tem de ousar ir além do statu quo, do jogo dos interesses e da retórica das aparências. Este é o quadro de uma acção profissional que tem de afirmar a excelência e a dedicação, que tem de praticar o espírito de serviço público, que tem de prescindir da tentação do rebanho e simultaneamente afirmar uma exigente solidariedade profissional.
Num tempo em que tudo se pede à escola, num tempo em que à profissão docente se atribuem tantas funções educativas e em que as práticas pedagógicas são atravessadas por inúmeras complexidades e tensões, temos de trabalhar (e de exigir) que a profissão docente seja, de facto, a primeira de todas as profissões.
José Matias Alves